sábado, 14 de dezembro de 2013

FLOR-ESSÊNCIA DA ALMA, por João Maria Ludugero

FLOR-ESSÊNCIA DA ALMA,
por João Maria Ludugero

Mãe, querida Maria Dalva,
Vi-te ainda outro dia estrela,
E parecias ainda tão moça,
Apesar de todos os teus anos
Não sei bem dizer
Porque razão a imagem
Cimentou
No momento
Em que a tua voz me disse adeus,
Sem nem poder se despedir de mim
E agora que não te vejo aqui,
Com o peso da saudade, 
Digo, de sentir nela:
Ele – o caminho
Elas – a vida/a morte
Fundiram-se 
E sei, percebo neste instante,
Que essa fusão parece incabível,
Gerando o tempo e a distância
Em que a única coisa que fica
É a imagem congelada,
Desligada da voz solene… 
E por mais que eu recorde depois da cerca-viva,
A bela senhora-menina que vi ainda outro dia
Tenho medo de manjar esse pronto adeus
(para onde foi a alma da flor em essência
quando a candeia queimou teu semblante?)

MALEMOLÊNCIA, por João Maria Ludugero

MALEMOLÊNCIA, 
por João Maria Ludugero.

Com destreza,
desnude-se.
Mexa-se,
cante e dance.
Faça seus planos,
preencha seus vazios;
empertigue-se,
levantes-se,
com maestria
sorria desperto 
em seus lumes. 
Cresça, habilite-se,
a partir de sua poesia.
Deixe seu tamanho horizontar-se, 
margeie o céu, dentro e alto.
E que o céu não seja seu limite.
Depois, não se arrependa,
pois tudo amanhã será só
desmanche podre e pó.

AMOR DE COLIBRI, por João Maria Ludugero


AMOR DE COLIBRI,
por João Maria Ludugero.

Chega o teu bico ao meu bico e aspira, amiúde,
o perfume que me anima o peito, o silêncio da raiz,
do incenso, da candeia luminosa a fender o hialino cristal.
Encanta, se quiseres, mas não canta em surdina. 
Despertes o colibri que dorme no meu peito. 
Ele sonha contigo e esvoaça pela Várzea a dentro dos jasmins. 
Não lhe sentes os adejares?
São solenes e leves como as pontas dos dedos circulando
o teu umbigo. Sentes, meu amor profundo?
Chega o teu bico ao meu. assim, suave
como a pétala que se dá ao vento, e que os teus olhos
adormeçam sobre o ensejo, que sejam anjos a zelar,
ou tiara divina, sobre teu corpo que me nina;
embalança tuas asas nas minhas asas, em ritmo sereno.
Dança em compassos de lã a dança pela Várzea das Acácias.
O retoque do sangue contra o sangue, a alma dentro da flor,
a onda contra o lajedo, e que os mistérios do prazer 
Convirjam em nós, no mais puro ânimo, timbrados 
pelos bicos auricolores sem segredo pelo vasto vão do interior.

ESSE CABRA SOU EU, por João Maria Ludugero

ESSE CABRA SOU EU, por João Maria Ludugero


A porteira do quintal 
dava às margens do rio Joca.
E aquele magote de moleques levados 
da breca pegava o beco de dona Neda.
E num piscar de olhos, lá estávamos, 
todos meninos e meninas, na beira do rio de Nozinho 
a tomar banho nas boias 
de câmaras-de-ar da oficina de Tonheiro.
A tarde caía amena. 
Na boca da noite, Horácio fechava o passadiço. 
Era o instante de a diversão 
tomar conta da rua do arame, 
antes de dar a hora de ir dormir.
Dentro, dependuradas nos armadores as redes 
de algodão de tear, memória do dia saudava 
a chegada da boiada de sonhos, 
agitando o cumeeira nas pálpebras do meninos.
Verde estética de lagarto tomando banho solar 
lá no paredão do açude do Calango.
Revoada de canários e periquitos 
primaverando a manhã varzeana.
Ainda boceja o horizonte com gosto de orvalho a tanger 
as folhas e catembas do verde coqueiral na beira do rio Joca.
Sensacional salto mortal de camaleão no tatame do vento.
Correria de borregos, cabritos 
e bezerros pelo labirinto da Várzea.
Cantiga de grilos, coaxar de sapos, jias e caçotes 
saltitantes na beira do rio ouvindo a hora passar 
sob a luz das bundas dos vaga-lumes.
No fogão de lenha, café com cuscuz de milho zarolho... 
Crepitam as achas no fogão à lenha:
- Quem vai querer grude, beiju, 
tapioca de coco ou brote de araruta?
Pé de mamão carregado de frutos 
a madurar bem alto só pra sanhaço se fartar. 
Azinhavrada moenda de caldo de cana 
no quintal dando água na boca da meninada. 
Cerca de varas entrelaçadas, difícil de pular. 
Roçado de feijão, milho, macaxeira, 
batata-doce, maxixe, melancia e jerimuns 
a enramar pelos leirões do Vapor.
Sino de São Pedro a badalar 
a hora do Angelus, Ave Maria!
- Vem jantar! Poente alaranjado, 
quase embriagado de vermelho tinto.
A lua se achega mais perto, 
airosa a enfeitar de prata a sela da noite.
Madrugada a dentro o cantar do galo 
quebra a barra da manhã dos Quilaras.
Acorda menino: - Já é hora de levantar! 
E o sol se levanta todo sorridente a pintar o dia 
do cabra varzeano, menino medonho e arteiro, 
tão cheio de energia, repleto de estripulias 
e teimosas esperanças novas.

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